Comunicado do DAP à Executiva do PT sobre federação

DAP reafirma posição sobre a Federação

A Secretaria do Diálogo e Ação Petista aprovou e decidiu encaminhar ao Diretório Nacional do PT texto de Markus Sokol (do Comitê Nacional do DAP e da Executiva nacional do PT), com uma análise detalhada da federação com o PCdoB e o PV. O texto, que transcrevemos abaixo, aborda os pontos do estatuto e da carta-programa da federação e reafirma as posições do DAP.


[Da Secretaria do Diálogo e Ação Petista para o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores]

Sobre a “Federação Brasil da Esperança (FE Brasil)”

No último dia 29 de abril de 2021, a Comissão Executiva Nacional (CEN) teve na sua pauta “Indicações do PT para composição da direção da Federação”. Mesmo se sabemos que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem prazo até 31 de maio para deferir ou não o registro da “FE Brasil”. Um nome que, quero crer, seja uma coincidência infeliz e não uma proposta de acrônimo para uma organização laica. 

É conhecida nossa posição a respeito desta deliberação pela federação, adotada por maioria no Diretório Nacional (DN), a qual deveria ter sido objeto de um congresso partidário que ouvisse a militância. Resumidamente: 

A estrutura da Lei 12.408 de 28/09/2021 que recém criou as federações – com regras, penalidades previstas em lei e uma competência extrapolada do judiciário sobre os partidos -, nunca foi discutida antes em instancia de direção do PT. Ela permite um tipo de federação que poderá ser uma camisa-de-força, com sérios riscos à independência política do movimento profundo que trouxe o Partido dos Trabalhadores do Colégio Sion até aqui. A federação é, no mínimo, uma hipoteca de, por pelo menos, quatro anos (prazo mínimo sob as penas da lei), uma hipoteca muito estranha para quem, como o PT, não está em petição de miséria. Ao contrário, apesar da perseguição que seus líderes vem sofrendo do interior das instituições podres do Estado brasileiro (até a ONU ao seu modo canhestro, 15 anos depois, afinal reconheceu), hoje o PT está em marcha para frente.

Mas nós do Diálogo e Ação Petista (DAP), componente do PT, todavia coerentes com nossa divisa de “agir como o PT agia”, nos orientamos para participar das instancias da federação, na luta cujo norte é que “O PT Continua!”.

Nesse sentido, remetemos abaixo às companheiras e companheiros do partido, algumas observações sobre a forma final da Carta-Programa e do Estatuto acordados entre as direções mandatadas do PT, PCdoB e PV, após prévias negociações com o TSE. 

Somos conscientes de que há relação entre a política de criar esta federação estatutária, ao invés de uma coligação majoritária, com a secundarização, e em alguns casos o abandono pelo PT, da disputa de candidaturas a cargos majoritários de governador e senador (com prazo decisório nos Encontros Estaduais até 29 de maio de 2022). Isso, em beneficio, no caso, de partidos outros que pretendem se coligar à federação na majoritária, ou que hoje nem mesmo isso pretendem, partidos da elite dominante que nem mesmo veleidades populares tem. 

Lealmente, o DAP declara que lutará com base na experiência comum e no quadro do partido, para retificar o que consideramos prejudicial aos interesses dos trabalhadores e dos oprimidos, no bojo da luta decidida pela vitória de Lula Presidente e dos candidatos PT aos cargos majoritários e proporcionais em outubro próximo. 

Esta luta começa hoje, já, no enfrentamento da fome, do desemprego, da opressão, do obscurantismo e da guerra, flagelos do capitalismo que alguém julgou ultrapassados, fatos que, na verdade, seguem nos pedindo a convocação de uma Assembleia Constituinte Soberana com Lula (nunca houve Constituinte Soberana no Brasil). Para isso, o PT é mais necessário hoje do que nunca.

Afinal, o PT não é um clube ou associação qualquer, é a única “instituição dos trabalhadores” política nacional e de massas que, malgrado percalços e graves problemas de adaptação à ordem, que não abordaremos aqui, esse PT guarda a raiz que queremos continuar. Tal como, as companheiras e companheiros o sabem, fomos e somos contra o modo eletivo do chamado Processo Eleitoral Direto, mas o disputamos há vários anos. 

E não nos conforta saber que há pior, partidos mais distantes do povo, com regime interno não democrático ou esclerosado. Cabe a cada partido tratar de si com seus filiados e militantes. Nós, de nosso lado, tanto sabemos que o PT é necessário para a disputa de outubro, que efetivamente é a disputa da hora, como queremos vencê-la com uma ampla frente “democrática e anti-imperialista” (6º e 7º Congressos do PT) ao redor do nosso programa de Reconstrução e Transformação – com a Constituinte Soberana em destaque -, que é um programa agregador.

Os problemas que por ventura houverem, como é da melhor tradição petista, resolveremos pela diálogo interno, pela consulta ao povo e pela experimentação, respeitadas as instâncias partidárias.

Agora vamos todos como um só, com a bandeira despregada, com a cabeça erguida e os pés no chão, até o ponto que o povo trabalhador considere útil e necessário. Até a vitória!

Saudações petistas!


Do programa (extratos grifados):

Os 15 tópicos abaixo selecionados pela sua relevância, alguns deles poderiam ser parecer “positivos” mas outros são claramente “negativos” numa avaliação relativa ao debate recente, que inclui a polemica do DAP contra a criação da federação do PT com o PSB, primeiro, e depois só com PCdoB+PV. De conjunto, contudo, estes pontos são extratos de um programa dentro da ordem, dominado pelo limite da atual mal chamada Constituição-Cidadã, aquela que sofreu 118 Emendas Constitucionais (PECs) reacionárias, Constituição sob a qual Lula ficou 580 dias ilegalmente preso, e com a qual Bolsonaro se fez “eleger” graças, principalmente, aos generais, almirantes e brigadeiros. 

A programa ficou assim depois que, por maioria, o DN recusou integrar a Constituinte Soberana, numa deliberação que foi uma regressão histórica em relação ao 6º e 7º Congressos. 

Há entre os pontos algumas “revogações”, outras vezes há acanhadas “revisões, mas se fala em “transformação”, só que “dentro da ordem” atual, o dominante. É o que explica a ausência da questão militar e, ainda mais, a questão da soberania nacional real em face do imperialismo mundial, o que vem a ser o mesmo problema. Calar não é realista. 

Por outro lado, o conjunto de reivindicações, bandeiras nacionais e internacionais de interesse operário, popular e democrático inscritas na versão final, deve ser considerado. O aparente “equilíbrio” final, na verdade, é ruim, remete à deriva programática de fundo do PT entre 1995 a 2017, até que o 6º Congresso reincorporasse a luta pela Constituinte Soberana. Mas a história não se repetirá igual, pois estamos em outra situação. Que vamos enfrentar!

Pontos destacados:

  • Compromisso de enfrentar em conjunto esta grave crise nacional, colocando como questão central de seu Programa e objetivo político a tarefa da reconstrução e da transformação nacional. 
  • Compromisso com o fortalecimento e o equilíbrio dos Poderes, com a restauração plena do Estado Democrático de Direito e com o avanço do Estado social, conforme afirma a Constituição. 
  • Gerar empregos, aumentar salários e aposentadorias e acabar com a inflação. 
  • Compromisso com a reforma agrária.
  • Desafio de reverter a desnacionalização do nosso parque produtivo e modernizá-lo. 
  • Ampliação da massa salarial e institucionalização de política de valorização substancial do salário mínimo
  • Recolocar os pobres e a classe trabalhadora no orçamento. Para isso, é preciso revogar o teto de gastos
  • Revogação da contrarreforma trabalhista feita no governo Temer e implementação de nova reforma trabalhista a partir da negociação tripartite, que proteja os trabalhadores, recomponha direitos, fortaleça a negociação coletiva e a representação sindical e dê especial atenção aos trabalhadores informais e apps. 
  • Além disso, também se impõe a necessidade de repensar o modelo previdenciário (*) do país, sua ampliação, cobertura e financiamento.
    (*) Acordo PT-PSOL (Valor 20/04) substituirá o “repensar” pela “reconstrução da seguridade e previdência”.
  • Transição energética e uma transição ecológica para uma nova estrutura produtiva de maior densidade tecnológica e de baixo carbono.
  • Fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), de seu caráter público e universal, aprimoramento da gestão, a valorização e formação, a reconstrução e fomento ao Complexo Industrial Nacional da Saúde. 
  • Uma profunda revisão das políticas implantadas por forças autoritárias.
  • Reforma política e eleitoral que aperfeiçoe a democracia representativa e promova a democracia participativa no país, com a recriação de instrumentos como conferências e conselhos. 
  • Compromisso com a paz, a democracia, a soberania e a autodeterminação dos povos.
  • Eleger um governo e uma forte representação no Congresso Nacional comprometidos com um programa de reconstrução e transformação nacional e com as medidas de emergência que a população exige para o enfrentamento imediato da fome, pobreza, carestia, desemprego, doenças e falta de moradias.

Do Estatuto Federação Brasil da Esperança FE Brasil
(comentários do DAP em azul)

Título I 

DENOMINAÇÃO, FINS E SEDE 

Art. 1º, § 1º: A Federação Brasil da Esperança é pessoa jurídica de direito privado, constituída como associação civil sem fins lucrativos nos termos do § 1º do art. 1º da Resolução TSE nº 23.670, de 14 de dezembro de 2021, tem prazo de duração indeterminado e sede no SCS, Quadra 02, Bloco C, n. 256, Ed. Toufic, 1º andar, Asa Sul, Brasília/DF. § 2º A Federação Brasil da Esperança é representada por seu ou sua presidente nacional, inclusive para fins judiciais e extrajudiciais. 

Se oblitera, daí em diante, o fato de que a “fe brasil” se subordina à lei 12.408 de 28/09/21, com todas as penalidades decorrentes da verdadeira camisa-de-força: se sair em menos de 4 anos pode perder o tempo de TV, o fundo partidário e o direito de coligar por duas eleições, à criterio do TSE.

Art. 2º A Federação Brasil da Esperança tem como finalidade a construção de unidade política e ação conjunta dos partidos políticos associados, em todo o território nacional, na defesa e implementação do seu programa, com estrita observância deste Estatuto e dos demais documentos aprovados pela sua direção. 

Se pretende aí que a federação seja uma associação de partidos, livre e voluntária, quando, na verdade, está enquadrada por pelo menos quatro anos “como uma nova agremiação partidária” (conforme a lei 12.408).

Art. 7º Os Partidos associados têm direito de: 

IV – apresentar, sempre que considere necessário ou adequado, propostas e sugestões a serem apreciadas pelos demais integrantes da Federação. 

§ 1º A filiada ou filiado indicado pelos Partidos associados deve representar e manifestar a posição de sua respectiva agremiação partidária dentro da Federação. 

Art. 8º São deveres dos Partidos associados:  

VII – apoiar as candidatas e os candidatos da Federação Brasil da Esperança, assim como as candidaturas majoritárias de coligação da qual ela faça parte; 

VIII – garantir que seus parlamentares cumpram com as decisões da Federação Brasil da Esperança quanto houver fechamento de questão;

Tem, portanto, um funcionamento “como uma nova agremiação partidaria”, tal qual os partidos politicos no brasil, em todos os níveis: câmaras municipais, assembleias legislativas e nas duas casas do Congresso Nacional, Câmara de Deputados e Senado Federal.

Título III 

ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO 

Art. 13. A Comissão Executiva Nacional é organizada em: 

XII – Secretaria de Articulação com Movimentos Sociais e Sociedade Civil; 

Expressa-se aí uma concepção não-democrática e antipopular – a democracia reconhece a luta de classes – quando se quer amalgamar numa mesma secretaia a militância de sindicatos, de organizações negras, de movimentos de mulheres, indígenas, lgbt, ou de organizações de juventude, tudo junto virando uma só “sociedade civil”, junto também com – por que não? –, com a Fiesp, a Febraban, a SRB, a Aprosoja, o Clube Militar, a UDR, a TFP etc.

Título IV 

FONTES DE RECURSOS, RESPONSABILIDADE E PATRIMÔNIO 

Art. 15. A manutenção e o funcionamento da Federação Brasil da Esperança serão custeados pelos Partidos associados, através de pagamento direto dos gastos da Federação, nos termos da legislação partidária. 

Será o PT quem pagará, de fato, as contas da federação, pois é quem tem de longe o maior fundo partidario; aliás, não se fala de nenhuma ‘proporcionalidade’ neste ponto…

Título V 

DISPOSIÇÕES ESPECIAIS PARA AS ELEIÇÕES DE 2022 

Art. 18. Fica criada, na estrutura da Federação, uma comissão provisória em cada um dos Estados e no Distrito Federal para representá-la nas respectivas circunscrições territoriais do país. 

§ 2º A comissão provisória estadual ou distrital será integrada pelos presidentes estaduais e distritais dos Partidos associados, podendo a Comissão Executiva Nacional alterar a sua composição e, a pedido do Partido associado, substituir seus integrantes. 

§ 3º A comissão provisória estadual ou distrital será responsável pela realização da convenção eleitoral conjunta da Federação Brasil da Esperança, bem como pelo registro das Candidaturas e a prática dos demais atos no processo eleitoral. 

Portanto, um comando fica criado de cima para baixo, desde o dia da autorização da “FE Brasil” pelo TSE.

Art. 20. Para a formação da lista proporcional, cada Partido associado terá direito de indicar candidaturas em número proporcional aos votos válidos obtidos em 2018 na eleição do cargo em disputa.  

Se começa aí a congelar a relação de forças entre os partidos federados, o que funcionará como uma espécie de seguro de vida para alguns deles, mas como um viés castratório para os outros.

Título VI 

DISPOSIÇÕES ESPECIAIS PARA AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS 

Art. 23. Para composição da lista de candidaturas proporcionais da Federação, em cada um dos Municípios, serão observadas as regras previstas nos art. 19 e 20, adaptadas para a eleição municipal. 

Nas eleições municipais de 2024 também valerá a mesma relação de forças de 2018 entre os partidos federados, com uma refração nas bancadas a serem eleitas. O voto popular poderá ser distorcido.

Título VII 

DISPOSIÇÕES GERAIS 

Art. 25. Para as eleições proporcionais que ocorrerem após 2024, aplica-se o disposto nos art. 19 e 20 para a composição das listas, adaptando-as para a eleição municipal quando for o caso.  

Ou seja, mesmo depois, em 2026 (!), valerá aquela relação de forças congelada de 2018, com os efeitos supra citados, seguro de vida para uns e viés castratório para outros.

Título VIII 

DISPOSIÇÕES FINAIS 

Art. 28. No ano de 2023, a Comissão Executiva Nacional promoverá processo de revisão do Estatuto e do Programa da Federação Brasil da Esperança. 

Parágrafo único. O processo de revisão deverá ser precedido de uma fase interna dos Partidos associados para que os órgãos municipais e estaduais possam participar ativamente na elaboração de propostas. 

Se prevê daqui há um ano uma especie de processo de consulta (“fase interna”) nos partidos, mas burlesco, pois a síntese final será acertada entre as cúpulas partidárias e os juiízes do TSE, outra vez.

Art. 30. § 2º. A primeira Assembleia Geral deverá se reunir no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da reunião de criação e constituição da Federação Brasil da Esperança.

§ 3º. Cada Partido associado deverá encaminhar à Federação Brasil da Esperança os nomes de seus representantes na Assembleia Geral, bem como as indicações de seus representantes para integrar a Comissão Executiva Nacional, no prazo de até 20 (vinte) dias, contados da data de criação da Federação Brasil da Esperança.

O assunto é complexo, mas claro quando se pode estudá-lo. Após os prazos previstos passarem, quando a militância mais ampla se der conta – muito antes de 2026! – como será que ela vai se sentir? O DAP está mais do que inquieto, segue contrário, a experiencia confiamos que mostrará.

Markus Sokol, pela Secretaria do Diálogo e Ação Petista

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